Deus sorri connosco

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Há memórias que ficam como sementes — mesmo quando se perdem por uns anos. Foi algures na nossa adolescência que nos cruzámos com um pequeno livro intitulado Deus É Humor, escrito por um sacerdote espanhol. Foi daqueles livros que se emprestam e se perdem algures entre mochilas, estantes e amigos. Mas, recentemente, com a ajuda da nossa filha (bendita paciência para vasculhar sites de livros usados!), conseguimos encontrar de novo um exemplar. Voltámos a lê-lo — e rimo-nos. Não porque o livro fosse uma piada, mas porque nos lembrámos de como faz sentido acreditar num Deus que sabe sorrir.

Aqui por casa sempre tentámos cultivar este humor que não fere: o humor inteligente, dos trocadilhos linguísticos que nos desmontam num segundo. O riso que se partilha, o riso que não goza com ninguém, mas ri com os outros e sobretudo ri de nós próprios. É este riso, acreditamos, que mais se parece com o de Deus: um riso sem limites porque não exclui, não humilha, não se impõe.

Não poucas vezes, damos por nós — pais, filhos e avós — mergulhados numa autêntica espiral de gargalhadas: daquelas que começam com uma piada parva e acabam numa contagiante choradeira de tanto rir. E, nessas alturas, sentimos que Deus está mesmo ali connosco, rindo-se também. Como se dissesse: “Vede como é bom este amor que se revela no vosso riso.”

Nestes dias, enquanto vemos por aí processos em tribunal a discutir se uma piada magoa ou não, lembramo-nos do quanto é preciso distinguir: uma coisa é rir dos outros, outra é rir com os outros. E aí Deus dá-nos o maior exemplo — nunca se ri de nós para nos humilhar, mas convida-nos a levarmo-nos menos a sério, para vivermos mais leves.

O Papa Francisco, que tanto nos marcou, dizia que “Um cristão triste é um triste cristão” (audiência de 15 de novembro de 2023), e foi um verdadeiro exemplo de humor cristão: contou piadas, fez trocadilhos e até chamou comediantes de todo o mundo ao Vaticano, para lhes agradecer o dom de fazer rir. Num dos seus últimos encontros, disse-lhes:

 

“No meio de tantas más notícias, vocês têm o poder de espalhar a serenidade e o sorriso. Vocês unem as pessoas porque o riso é contagiante.” (14 de junho de 2024)

E lembrava também que, se possível, nunca perdessem a capacidade de rir de si próprios, porque quem se leva demasiado a sério deixa pouco espaço para a alegria de Deus.

Este espírito está bem vivo em tantas famílias — como se ouve naquele podcast tão certeiro Deus Também Ri: o humor tem o poder de criar cumplicidade, de unir as gerações, de sarar feridas antigas. O riso, quando é verdadeiro, abre espaço para o amor, porque é impossível rir juntos sem partilhar algo de profundo.

Talvez este seja o segredo para atravessar as contrariedades da vida familiar: não perdermos este riso que cura discussões, desfaz tensões, aproxima gerações. O riso que passa dos avós para os netos, que se renova num trocadilho na hora de jantar, que se multiplica à mesa, nas longas conversas, nas recordações de quem já partiu, mas continua vivo no sorriso que deixou.

Este mês, deixamos-te este convite: descobre onde Deus te faz rir. Solta uma gargalhada em família, ri-te de ti mesmo, brinca com os teus filhos, escuta uma piada que os filhos te contarem (mesmo aquelas sem grande graça…). E quando o mundo lá fora parecer sisudo demais, lembra-te: Deus sorri contigo, mergulha contigo nessa espiral de gargalhadas e faz do teu riso uma oração.

 

 

11/07/2025
De família para família

Autor

  • Somos a Sofia e o Paulo, com uma história comum iniciada precisamente na Paróquia da Amadora, onde nos conhecemos em 1992. Na altura, com o jornal da Paróquia, trabalhámos juntos na direção do Partilhar, atividade que acabou por nos unir cada vez mais. A nossa vivência na comunidade juvenil foi forte e profunda: fomos catequistas, animadores de grupos de jovens, fizemos parte de coros (Rumo à Festa, Bombo da Corte) e muitos outros grupos (Fé e Vida, Jovens sem Fronteiras, Compromisso, Caminhar), incluindo o grupo de teatro Animateia. Casámos em 2003 e a vida afastou-nos da Amadora, mas nunca no-la tirou do nosso coração. Continuamos a dar testemunho do que levámos da Paróquia da Amadora, do Sr. Prior (Cónego Marim), do Padre Cabral, do Padre Vítor, do Padre Pedro, mas agora junto da Paróquia de Torres Vedras, junto à nossa atual residência. Somos pais felizes do Santiago, da Verónica e do Mateus, cuja alegria, sucessos e personalidades nos preenche o coração de gratidão.

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