by Padre Carlos Jorge | Jul 22, 2025
Jesus visita Marta e Maria.
Não sabemos se entra acompanhado ou sozinho.
Jesus não tem qualquer problema, nem sente incómodo perante as normas vigentes.
É livre. Tem o coração inteiro, arrumado, sereno, esclarecido, puro.
Jesus entra na casa daquelas irmãs. E entra nas casas dos que Lhe abrem a porta.
Marta está à vontade com Jesus. Deseja receber bem o amigo.
Desdobra-se no preparo do repasto. Esforçada e zelosa, mas agitada e dividida.
Não há pausa para ela. A não ser para lançar a Jesus uma reprovação e uma ordem:
“Não te importas que a minha irmã me deixe sozinha a trabalhar? Que venha ajudar!”
(Por que razão envolveu Jesus e não interpelou Maria directamente?)
Maria está sentada aos pés de Jesus. Silente, ligada, escutadora.
Percebeu que Jesus não é seu hóspede. Ela é que é hóspede de Jesus.
Quando Jesus entra numa casa, Ele passa a ser a Casa.
Jesus, gentil, mas assertivo, responde a Marta:
“Marta, Marta, andas tão ocupada com muitas coisas. Uma só é importante.
Maria escolheu a parte boa.”
Jesus não critica o labor de Marta, mas a sua agitação exterior e interior.
Adverte-a para um excesso que causa ansiedade, de um afadigar-se que cansa a alma.
Jesus está ali e Marta parece estar noutro local. Tão perto e, contudo, tão longe.
Marta oferece serviço, mas não companhia.
Jesus relativiza a refeição e todo o aparato. Ele é a Refeição e o Tudo.
Lembra a Marta (e a todos nós) que o fundamental, não é o que fazemos para Ele,
mas o que permitimos que Ele faça para nós e em nós.
Fazer e ser com Ele e por Ele.
E o primeiro passo, vital para que tal aconteça, é escutar Jesus.
É a parte boa (ou a parte bela). Maria percebeu. Marta não percebeu.
“Marta” e “Maria” moram dentro de nós.
É imperioso encontrar o equilíbrio e a estabilidade entre as duas “irmãs”,
entre a escuta de Jesus, que dá sentido e rumo às nossas decisões e acções,
e o trabalho quotidiano, que deve evidenciar a fragrância daquele Encontro com Ele.
Recordamo-nos do lema dos monges beneditinos: Ora et labora – Ora e trabalha.
Como cristãos, entregamo-nos a inúmeras actividades e projectos.
Mas quantos é que são realizados verdadeiramente com Ele?
Um velho rabino dizia acerca de outro colega:
“Anda tão ocupado com as coisas de Deus, que até se esquece que Ele existe”.
Não acontece connosco, por vezes?
PCJ
17/7/25
by Padre Carlos Jorge | Jul 15, 2025
Uma desconfortável inquietação abalroou-me:
então, Jesus, não vai ter em conta o facto de eu ser cristão e, até, padre,
o curso de Teologia, as horas de estudo e de trabalhos, as Eucaristias que celebro,
os tempos de oração, as reuniões sem conta, as peregrinações em que participo,
os retiros que oriento, as andanças daqui para ali?
Para receber o Reino, não é necessário e suficiente tudo aquilo?
“Sempre que tu deste de comer e de beber a um precisado, vestiste o desnudado,
acolheste o forasteiro, visitaste o doente e o cativo, foi a mim que o fizeste.”
A grelha de leitura de Jesus sobre a nossa vida tem, apenas, um item: amar.
Deus não se agrilhoa a invólucros religiosos ou vestiduras espirituais.
Nem a termos, como: crente, praticante, não praticante, agnóstico, ateu.
O seu Sonho é que cuidemos uns dos outros. Com gestos concretos.
Entendemos?
P. Carlos Jorge, in VENTO NESTE CAMINHO DE PEDRAS,
de P. Carlos Jorge (textos), Carina Tavares e João Afonso (ilustrações)
2021
by Padre Carlos Jorge | Jul 8, 2025
Hoje, como naquele tempo, a ‘seara é grande, mas os trabalhadores são poucos’.
Há tantos espaços que necessitam urgentemente da presença do Deus da Misericórdia!
Jesus pede mais ‘trabalhadores’: precisa de ti e de mim. De todos os seus discípulos.
Mas, se muitos não escutam o apelo de Jesus, outros apresentam-se ao serviço.
Jesus envia-nos como cordeiros para o meio de lobos. O cordeiro é morto, não mata.
Como bagagem, levamos, somente, o próprio coração. Leve e livre. Cheio de Deus.
É que o anúncio do Evangelho não se opera com ‘coisas’, ou com ‘truques’,
mas com o testemunho quotidiano de amor a Jesus e aos outros.
O sinal mais genuíno do reino é a Paz. A Paz de Deus. A Paz é a nossa primeira oferta.
Não nos detemos em minúcias que retardam a cadência urgente da missão.
Nas casas que nos acolhem, aceitamos, com gratidão e simpatia, o que nos é oferecido.
E curamos enfermidades. Muitas debelam-se com um simples sorriso ou um abraço.
Antes de sairmos, deixamos a boa notícia: o Reino de Deus está próximo.
Para um discípulo de Jesus, ser missionário não é algo opcional: faz parte do seu ADN.
A nossa tarefa é a de preparar os lugares e cidades aonde Jesus deseja ir.
Estamos ali, de passagem, para comunicar que Jesus quer estar ali.
Um grupo de discípulos está prestes a partir.
Mais alguém quer juntar-se a eles?
P. Carlos Jorge, in VENTO NESTE CAMINHO DE PEDRAS,
de P. Carlos Jorge (textos), Carina Tavares e João Afonso (ilustrações)
2021
by Padre Carlos Jorge | Jul 1, 2025
“Quem dizem as multidões que Eu sou?”
Jesus não está interessado em saber a posição que ocupa no ranking dos famosos,
Quer indagar como O estão a entender e a captar a sua mensagem.
Não deve ter ficado muito alentado com as informações fornecidas pelos discípulos.
Aquela pergunta de Jesus atravessou os tempos e chegou até nós:
“Quem dizem as pessoas de hoje que Eu sou?”
As respostas superam, em quantidade e originalidade, as de há 2016 anos atrás.
No meio delas, reaparece a segunda interrogação que Jesus havia colocado aos doze,
bem mais relevante do que a primeira:
“E vós, meus amigos e discípulos, quem dizeis que Eu sou?”
Jesus não se compraz com enunciações de catecismo ou declarações aduladoras.
Ele quer certificar-se de que estamos com Ele, não por engano, mas a sério.
E levamos Jesus a sério quando nos largamos de nós mesmos e nos lançamos n’Ele;
quando aceitamos os momentos de rejeição, de incompreensão, de agressão, de cruz,
por sermos de Jesus e por querermos viver como Ele, todos os dias;
quando testemunhamos, contestando a lógica corriqueira, que, ao lado de Jesus,
perder a vida por Ele, dar a vida por Ele, é ganhá-la para sempre.
“Quem sou Eu para ti?” — pergunta-te Jesus, olhos nos olhos.
Vacilas na resposta ou as palavras estão prontas a soltarem-se do teu coração?
P. Carlos Jorge, in VENTO NESTE CAMINHO DE PEDRAS,
de P. Carlos Jorge (textos), Carina Tavares e João Afonso (ilustrações)
2021
by Padre Carlos Jorge | Jun 24, 2025
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a tua amiga. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu esposo. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a tua esposa. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu filho. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu pai. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a tua mãe. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu funcionário. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu empregador. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a tua vizinha. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te o teu avô. Quai a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a tua neta. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a Igreja. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou eu para ti? – pergunta-te a comunidade. Qual a tua resposta? É mesmo?
Quem sou Eu para ti? – pergunta-te Jesus. Qual a tua resposta? É mesmo?
Da resposta a esta interrogação de Jesus dependem todas as tuas outras respostas.
É que, com Ele, serás capaz de pintar todas elas com as cores do Céu.
Entendes?
PCJ
by Padre Carlos Jorge | Jun 17, 2025
Quantos exploradores, ao longo dos tempos, se lançaram na fascinante aventura
de alcançarem e embrenharem-se na intelecção da Santíssima Trindade!
No decorrer do percurso acamparam aqui e ali. Em cada paragem, novas perquirições.
E partiam. Mais enriquecidos. Mas sempre incompletos.
No fim do itinerário nenhum deles conseguiu atingir o objectivo.
Devemos ficar surpreendidos?
Escreve Santo Agostinho nas linhas finais da sua obra De Trinitate (Sobre a Trindade):
“Um sábio, no livro que é conhecido com o nome de Eclesiástico, disse ao falar de Ti:
‘Dizemos muitas coisas e não chegamos, e toda a consumação das palavras é Ele.’
Quando, pois, chegamos a Ti,
cessarão estas muitas palavras que dizemos e não chegamos.”
Sim, tal como Agostinho e todos os outros, por mais que avancemos, não chegamos.
“Falamos de Deus. Qual a admiração se não compreendes?” (Santo Agostinho).
Somos buscadores de Deus. Vamos chegando. E zarpando. Mas não desistimos.
Adentramo-nos no Mistério, que não é algo que não se compreende,
mas algo que nunca acaba de se ir compreendendo. Há sempre mais estrada.
Jesus falou-nos d’Ele, do Pai e do Espírito.
O Pai que ama o Filho. O Filho que ama o Pai. O Amor entre o Pai e o Filho.
Num único Amor, Três: o Amante, o Amado, o Amor entre os dois.
Ou seja: 1 + 1 + 1 = 1. A matemática de Deus é diferente da nossa.
Gregório de Nazianzo “baptizou” a ligação e interpenetração das Três Pessoas,
com o termo pericorese, que vem do grego antigo perichōrēsis:
peri (ao redor) e chōreō (dar espaço, mover-se).
Pericorese é o nome de uma dança infantil tradicional.
As crianças, de mãos dadas, bailam num padrão circular.
Uma criança fica no meio, cantando, enquanto as outras giram ao seu redor.
Em certo momento, a criança que está no meio troca com uma da roda.
Deus: Três Pessoas que dançam em volta de si mesmas.
É uma representação metafórica. Mas não é um belo ícone da Santíssima Trindade?
Tudo lá está: comunhão, unidade, cumplicidade, ternura, alegria, liberdade, paz.
E este Deus, Uno e Trino, convida-nos para a sua Dança.
Convoca-nos para viver n’Ele e como Ele.
Rejubila quando conseguimos reproduzir os ritmos da sua coreografia.
O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, escreveu na obra Assim falou Zaratrusta:
“Eu só acreditaria num Deus que soubesse dançar.”
O meu Deus Dança.
Quem quer juntar-se ao Baile?
PCJ
13/6/25